Um dia quando aquele pequeno menino abriu os olhos pela manhã,
vislumbrou ao olhar pela janela futuros e coisas que jamais se concretizariam,
mas em algum momento não sei ao certo dizer qual, talvez tão impreciso quanto o
próprio tempo, começou a caminhar, foi em busca de lições, aventuras e
sabedoria e a cada mês que se passava e a cada vírgula que aprendia lhe
mostravam outras mais, e regras que não muito lhe diziam. Foi dessa curiosidade
de saber sempre mais e ir em frente, nunca, nunca para trás, que lhe apeteceu
os estímulos, pelos livros e pela leitura, muitas vezes muito mais pelos livros
como estrutura física, sejamos sinceros, mas lhe valiam se não em um momento em
outro sem dúvida.
E o menino tinha
nome, soberbo e coerente, comum, porém austero e sempre se fez apreciador de
que o usassem com integralidade, muito diferente de outros por aí tão
incomodados com seus nomes compostos. Se fez galante e como exemplo do que
tanto viu em seus gastos livros tomou seu caminho, longe esse de ser dos mais
fáceis, mas mais ainda de ser o mais difícil, isso é claro, para ele difícil era
o caminho errado, o caminho do fracasso, não haveria pior derrota e
infelicidade, mas bom, houveram tempos em que o pobre quase descarrilhou de
caminho, mas já adianto e deixo claro que não caiu nas vias de fato, e mesmo
que o tivesse, o que importaria? No fim, substancialmente ele conseguiu o que
queria.
E o menino se fez
homem e como homem, responsável, seus planos nem todos eram os mesmos, mas no
final que diferença faria? Os livros estavam lá, presentes e diferentes, os
velhos com novas interpretações, e os novos um burburinho de ideias, talvez
deveria ter parado por ali, mas lhe restava tempo ainda, pra escolhas, mudanças
e reflexões, e mal sabia ele que já era momento de ação.
E os anos foram se
passando, não mais meses como em outrora, e os dias que pareceram um certo
tempo tão longos já não lhe eram suficientes, nem para seu caminho, nem para
suas leituras à prazer, talvez muito menos para com seus próximos, o que talvez
seja o pior. Seu caráter não era injusto, mas muito questionável a certos olhos,
talvez o que lhe faltasse não fossem livros, nem os de ficção, nem os de
história, mas uma certa ignorância que só quem não possui consegue admirar e
valorizar. Amar já lhe ocorreu, de sua forma louca e agonizante, mas também lhe
foi perceptível que o ardor de seu peito com a calmaria era apagado, gostava de
êxtase, fervor e opulência de sentimentos, se não de nada lhe valia, adorava a
inspiração, mas não creio que tenho se curado ao longo do tempo, foi-se
petrificando, e aos poucos se congelou, não se exaltava nem se enamorava como
em outrora, mas o carinho estava lá, talvez sinal de madurez.
Se fez Mestre, Doutor, graduado com honradez, se criou por
conta própria, e trabalhou, como trabalhou. Descobriu inovações, ninguém nega
sua contribuição, e vez ou outra quando lhe sobrava tempo, viajava, conhecia
exoticidades, e nas dificuldades sabemos que até se ajoelhou, fez seu nome ser
marcado, não mais um como tantos outros, talvez menos do que almejara. Os
livros ainda estavam lá, mas já não os lia como inspiração, seu tempo passou e
ele sabia, mas o objetivo ao qual a muito já lhe avia chegado já não lhe enchia
os olhos.
Envelheceu, com
dinheiro, amigos, família, mais sobrinhos que quaisquer outros, não se casou ou
pôs à frente sua prole, teve seus casos de paixão e amor e aqueles de carinho
que duraram mais que quaisquer outros, e num dia qualquer de um mês de
primavera nos deixou pra trás e seguiu em frente, geladeira cheia, uma meia
dúzia de contas à pagar com seu devido dinheiro separado, plantas regadas e
floridas no cume das janelas e laterais das portas, não parecia ter previsto
aquilo, por mais previsível e calculada tivesse sido sua existência, ora
enfadonha, ora gratificante. Viveu muito, cerca de 87 anos, mas há muitos que
se questionavam, será que viveu mesmo? Houve uma nota aqui e outra acolá em
jornais soltos por aí, alguns com certo alcance, nenhum muito popular, no
sentido elitista da palavra. Seu nome afinal ficou marcado e conhecido, talvez
nem tanto nas memórias, mas de certo nos papeis, talvez não nos papéis certos a
que teria tanto desejado, mas estava lá impresso, com todas as letras sem sequer
um retrato, fazendo-se assim mais um igual num mar de diferenças.
No fim lhe restou as
palavras e uma dúzia e pouca de lágrimas, mas independente do caminho será que
há alternativa?